quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Morreu o ex-presidente Kirchner, o homem do poder na Argentina

por SUSANA SALVADORAmanhã
Morreu o ex-presidente Kirchner, o homem do poder na Argentina
Marido da actual Chefe do Estado, Cristina Kirchner, sofria de problemas de coração.
Os problemas de saúde do ex-presidente Néstor Kirchner, de 60 anos, eram conhecidos, mas a sua morte deixou a Argentina em choque. Milhares de pessoas eram esperadas ontem à noite na Praça de Maio, para prestar homenagem ao homem que, para muitos, detinha o verdadeiro poder - actualmente nas mãos da sua mulher, Cristina Kirchner. O velório terá início hoje às 12.00 (16.00 em Lisboa) na Casa Rosada (palácio presidencial).
O casal estava na sua residência em El Calafate (Patagónia), quando Néstor se sentiu mal. O deputado e líder do Partido Justicialista foi levado de imediato para o hospital, mas os médicos não conseguiram reanimá-lo. Segundo o relatório clínico, Kirchner teve uma paragem cardiorrespiratória com morte súbita. Cristina acompanhou-o sempre, tendo informado os dois filhos - Máximo e Florencia (que vive nos EUA).
Esta é a primeira vez que um ex--presidente será velado na Casa Rosada, sendo o Congresso o palco normalmente utilizado para esta homenagem. Néstor Kirchner será depois enterrado na sua terra natal, na região de Santa Cruz.
As reacções de pesar chegaram de todos os pontos da sociedade argentina. O destaque foi para a sua presidência (2003-2007), que ficou marcada pela recuperação económica e pela luta pelos direitos humanos. Durante o seu Governo foram declaradas ilegais as leis de amnistia para os crimes da ditadura e tiveram início os processos contra ex-militares.
A comunidade internacional também expressou as suas condolências, com países como o Brasil ou a Venezuela a decretarem três dias de luto nacional. Néstor Kirchner desempenhava actualmente o cargo de secretário-geral da União das Nações Sul-Americanas (Unasur), tendo desempenhado um papel crucial na última contenda diplomática entre Caracas e Bogotá. "É uma grande perda para a Argentina e para o continente", reconheceu o Presidente colombiano, Juan Manuel Santos.
O ex-presidente tinha sido internado por duas vezes, só este ano, devido a problemas cardíacos. A 7 de Fevereiro foi operado de urgência, depois de ter começado a perder sensibilidade no braço esquerdo. Os médicos removeram então uma placa ulcerada da carótida direita, numa operação considerada "um sucesso".
Mas em Setembro, o coração de Kirchner voltou a dar sinais de fraqueza. Na noite de 11 de Setembro, o deputado teve de se submeter a uma nova intervenção por obstrução de uma artéria coronária. Os médicos fizeram uma angioplastia, tendo sido colocado um stent (um pequeno tubo que permite "abrir" a artéria).
O ex-presidente recebeu ordem de repouso, mas manteve a sua agenda inalterada. Além de deputado, líder partidário secretário- -geral da Unasur, era ainda apontado como possível candidato presidencial em 2011. Isto apesar dos escândalos que o rodeavam. Um deles referente às acusações de enriquecimento ilícito: a fortuna dos Kirchner, segundo a declaração patrimonial, ascende actualmente a 11 milhões de euros. Tal significa um aumento de 700% desde a eleição de Néstor, em 2003.
Além disso, a sua popularidade (era de 60% quando deixou a presidência) também foi afectada por algumas medidas do Governo, nomeadamente pelos conflitos com o campo e as acusações de que o casal queria controlar os media. Estas crises contribuíram para a perda da maioria do Partido Justicialista no Congresso, nas eleições legislativas de Junho de 2009.
"A continuidade institucional não está em perigo na Argentina, mas pode estar a governabilidade no final do mandato de Cristina, se ela não aproveita o que possivelmente é a sua oportunidade histórica: deixar de ser a Presidente de uma facção, para passar a ser a de todos os argentinos", escreveu Rosendo Fraga no La Nación. O director do Centro de Estudos União para a Nova Maioria lembrou que "até ao último momento, Kirchner fez questão de tornar evidente que era ele quem exercia realmente o poder e não a sua mulher".

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