A cúpula da Unasul realizada na segunda-feira à noite para discutir a crise na Bolívia marca o crescente peso que o presidente Luís Inácio Lula da Silva está adquirindo na região, segundo reportagem publicada nesta terça-feira pelo jornal espanhol El País.
Em matéria intitulada, "Lula toma as rédeas da crise boliviana", o diário diz que Lula apresentou uma série de exigências para aceitar ir ao encontro em Santiago do Chile, e o fato de elas terem sido acatadas, demonstram sua importância na mediação do conflito.
"A presidente do Chile, Michelle Bachelet - país que exerce a presidência temporária da Unasur -, convocou a reunião, mas foi Lula quem deu transcendência a ela, ao confirmar sua presença e conseguir que as partes em conflito na Bolívia lhe entregassem sua confiança", escreve o El País.
"Lula impôs condições para viajar a Santiago e as conseguiu. Pediu uma trégua prévia entre (o presidente boliviano Evo) Morales e a oposição, o que foi feito. Exigiu a aceitação expressa de La Paz para que ele intercedesse na crise, e a obteve. Mais, os rivais de Morales comemoraram a mediação brasileira, apesar de Lula os ter repreendido por usar a violência para desafiar o governo." Ainda segundo o jornal, na cúpula ficou mais clara a distância que se abre entre o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, "que se converteu em ator do conflito ao expulsar de seu país, em solidariedade com Morales, o embaixador dos Estados Unidos, e que chegou a Santiago com um discurso antiimperialista", e Lula, cujo país "requer gás boliviano e que nos dias anteriores se transformou em estandarte da não intervenção nos assuntos internos do país".
A reunião só se tornou viável com a presença de Lula, que antes de aceitar participar teria exigido a presença de Morales e que ele aceitasse os resultados, diz o jornal, para quem "o Brasil não quer ingerências externas no conflito, nem insultos aos Estados Unidos".
"Sem a presença dos Estados Unidos na Unasul - uma das razões que explica a existência deste foro -, o Brasil, maior potência econômica da América do Sul, está começando a exercer nesta crise um papel mais preponderante. Além dos vínculos energéticos, e de ser o maior sócio comercial da Bolívia, o Brasil divide uma fronteira de 3.400 quilômetros com o país andino, cuja importância estratégica, apesar da falta de litoral, foi percebida cedo por Che Guevara nos anos 60." O El País conclui dizendo que antes de partir para a cúpula, Lula parece ter mandado um recado para a Venezuela e Washington, quando afirmou que uma solução para a crise requer a consolidação do processo democrático e de respeito à Constituição.
'Washington Post' Ainda sobre a crise na Bolívia, o jornal americano Washington Post publica nesta terça-feira um editorial em que afirma que Morales está levando o país "à desintegração ou guerra civil".
"Ficou claro há muito tempo que a tentativa do presidente Evo Morales de importar o modelo de socialismo autoritário de Hugo Chávez para a Bolívia polarizou o país em torno de linhas étnicas e geográficas, arriscando desintegração ou guerra civil", afirma o editorial.
O diário destaca que o Exército ocupou uma dos cinco Departamentos liderados pela oposição, depois dos confrontos que deixaram 30 mortos nos últimos dias, e afirma que os dois lados estão recorrendo à violência.
"Os governos (estaduais) da oposição merecem culpa por tolerar - no mínimo - a violência de seus correligionários. Mas Morales permanece o maior provocador na Bolívia. Encorajado por sua vitória no referendo revogatório de agosto, ele tentou marcar outro referendo sobre a Constituição, que aumentaria ainda mais sua autoridade." O editorial ainda comenta a cúpula da Unasul, afirmando que "Chávez está fazendo o melhor que pode para escalar a crise, até ameaçando intervir militarmente na Bolívia".
"Mas os Estados Unidos também têm poder de influência. A Bolívia recebe mais de US$ 100 milhões em ajuda americana por ano, e cerca de 30 mil empregos no país mais pobre da América do Sul dependem da renovação das preferências comerciais que expiram em dezembro", afirma o Washington Post, para quem os contratos só devem ser renovados se Morales chegar a um acordo com a oposição.
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